quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Débito Automático

Não são poucas as pessoas que por falta de planejamento financeiro, ou descontrole nos gastos, contraem dívidas que se tornam impagáveis, e comprometem inclusive todo orçamento familiar. Quando a dívida é com instituição financeira, a situação pode ficar pior ainda, pois normalmente os bancos se cercam de garantias contratuais, que as vezes até extrapolam as permissões da lei.

Em se tratando de divida, o banco pode se apropriar do salário do cliente, para cobrar débito decorrente de contrato bancário, quando há cláusula que permite o débito automático em contrato de adesão?

O Ministério Público de Minas Gerais ajuizou ação contra o Itaú Unibanco S/A, devido a instituição financeira debitar integralmente o salário dos consumidores, para pagamento de dívidas bancárias decorrentes de empréstimos, juros de cartão de crédito, tarifas e outras dívidas.

O juízo de primeiro grau, com uma visão legalista da relação contratual, entendeu que, por haver no contrato cláusula de débito automático, de empréstimo em conta corrente, seria legal a cobrança. Ressaltou o magistrado que “uma vez depositado em conta, o valor é crédito, não é salário nem moeda, não havendo que se falar em violação da norma do artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil”.

Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso de apelação porém foi mantida a sentença. Segundo o Tribunal, também não havia nenhuma ilegalidade no desconto de parcelas, referentes ao pagamento de empréstimo, debitadas da conta corrente do cliente, pois o correntista, ao firmar contrato e concordar com as cláusulas, teve plena consciência de que essa seria a forma de pagamento.

Para reverter essa visão retrograda do contrato, sobretudo na relação de consumo, só restou levar o caso para o Superior Tribunal de Justiça. A tese sustentada no Recurso Especial n. 1405110, foi a de que a instituição financeira estaria fazendo descontos superiores ao limite de 30% do salário, chegando até mesmo a debitar integralmente o salário dos consumidores; portanto, a cláusula permissiva seria abusiva.

No STJ, prevaleceu o entendimento de que, mesmo com cláusula contratual, permitindo o débito automático na conta do cliente, a apropriação do salário do correntista pelo banco é ilícita e dá margem a reparação por dano moral. Portanto, o banco não pode se apropriar do total do salário de seu cliente, para cobrar débito decorrente de contrato bancário, mesmo havendo cláusula permissiva no contrato de adesão.

Esses e outros direitos do consumidor, que são violados sobretudo pelas instituições financeiras, o que, em algumas situações, é tolerado pelo judiciário -, reacendem as discussões, da proposta de atualização do Código de Defesa do Consumidor, que já está em trâmite no Congresso Nacional, e trata inclusive, da modalidades de crédito de empréstimo consignado.

O projeto não apenas consolida o entendimento, de que a soma das parcelas para o pagamento de dívidas, não poderá ser superior a 30% da renda mensal líquida. Mas também estabelece que as instituições financeiras, serão corresponsáveis pelo superendividamento do consumidor. No caso de descumprimento dos limites, devem as instituições financeiras até mesmo rever os prazos de pagamento e reduzir juros e multas?

O projeto estabelece que o consumidor poderá, em sete dias, desistir da contratação de crédito consignado, a contar da data de celebração ou do recebimento da cópia do contrato, sem necessidade de indicar o motivo.

Foi considerado o novo cenário econômico brasileiro, e a inclusão de milhares de pessoas no sistema bancário nos últimos anos; portanto, há necessidade de se criar mecanismos, que coíbam práticas abusivas dos Bancos.

Entretanto, é sempre bom lembrar que devemos observar o consumo responsável. É necessário consumirmos para a economia não estagnar, porém devemos ficar sempre vigilantes com os endividamentos em excesso.
Denis Farias é advogado
www.denisfarias.com

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