quarta-feira, 6 de março de 2013
Direito de Vizinhança
Para satisfação de interesses de proprietários em conflito, o parâmetro usado pelos Tribunais são as normas do direito de vizinhança.
Todos desejam que o lar seja um lugar de sossego e descanso. Para isso, em muitas situações há necessidade de interferências do Judiciário, para que o convívio entre vizinhos não vire uma guerra.
Muitos problemas poderiam ser facilmente resolvidos sem a mediação do Poder Público se fosse praticada a consciência de que, para viver bem em comunidade, é necessário agir pensando no coletivo e não somente no conforto e bem estar individual. Até porque o nosso ordenamento jurídico não tolera o abuso de direito, o desvio no exercício do direito, de modo a causar dano a outrem.
Para disciplinar o uso da propriedade, o Código Civil estabeleceu os chamados direitos de vizinhança, para dirimir conflitos de interesses causados pelas recíprocas interferências entre propriedades imóveis próximas. O objetivo é evitar prejuízos entre os proprietários e interferências indevidas nos imóveis vizinhos.
Um caso corriqueiro em gerar divergências entre vizinhos é o plantio de árvores, ou seja, o uso do subsolo. Uma disputa entre vizinhos que precisou da interferência da Corte Superior de Justiça.
O conflito surgiu pela construção de muro no limite entre duas propriedades, os donos de um imóvel pretendiam que o muro do vizinho fosse derrubado, sob o argumento de que estaria atrapalhando sua vista panorâmica para uma lagoa.
No decorrer do processo, as partes celebraram acordo judicial, no qual fixaram condições para preservação da vista, iluminação e ventilação, a partir de um dos terrenos. A altura do muro foi reduzida.
Entretanto, quando tudo parecia resolvido foram plantadas árvores que acabaram tapando novamente a visão da lagoa e o caso fora levado novamente ao Judiciário. O juízo de primeiro grau determinou que as árvores limítrofes fossem podadas, para que não ultrapassassem a altura do muro divisório.
O prejudicado interpôs recurso de apelação, e o Tribunal de Justiça reformou a sentença, entendendo que o acordo firmado entre as partes não havia garantido o direito à alegada “servidão de vista” – o que, segundo o tribunal, nem existe no sistema brasileiro.
No Superior Tribunal de Justiça, o relator do recurso especial, n. 935.474, ministro Ari Pargendler, entendeu que o acordo havia sido integralmente cumprido. Além disso, que não havia proibição quanto ao plantio de árvores, que seria um direito assegurado ao proprietário, dentro de seu terreno.
No entanto, na Corte o tom das discussões não foram pacíficas. A ministra Nancy Andrighi divergiu do entendimento do relator. Quanto à alegada inexistência de servidão de vista, ela afirmou que o TJ local fez confusão entre servidão predial legal e convencional.
Foi levado em consideração que as servidões legais correspondem aos direitos de vizinhança, tendo como fonte direta a própria lei. Possibilitam a exploração integral do imóvel dominante ou evitam o surgimento de conflitos entre os respectivos proprietários, independem da vontade das partes.
Em última análise, as servidões convencionais, ou servidões propriamente ditas, não estão previstas em lei, decorrem do consentimento das partes. A transação no caso em apreço foi equiparada, a uma servidão convencional, que representa uma obrigação a ser respeitada pelas partes.
Ao considerar a obrigação assumida, de preservação da vista da paisagem a partir do terreno vizinho. O STJ verificou que o direito ao plantio de árvores foi exercido de forma abusiva, pois houve o descumprimento, ainda que indiretamente, do acordo firmado. E assim, os vizinhos foram sujeitados aos mesmos transtornos causados pelo antigo muro de alvenaria.
O Tribunal acompanhou a divergência, deu provimento ao Recurso Especial, e o vizinho que plantou as árvores foi abrigado a podá-las, até a altura do muro para preservar a vista para a lagoa.
Nesse julgado o Tribunal discerniu o que é direito de vizinhança e o que é servidão legal. As servidões são direitos reais sobre coisas alheias, por ela perde o proprietário do prédio serviente o exercício de alguns de seus direitos dominicais ou fica obrigado a tolerar que dele se utilize para certo fim, o dono do prédio dominante. Distinguem-se dos direitos de vizinhança, pois são limitações impostas por lei ao direito de propriedade, restrições recíprocas e prescindem de registro.
Denis Farias é advogado e escritor
www.denisfarias.com
Artigo também publicado terça-feira, 05 de Março de 2013, no Jornal O Liberal, Caderno Direito & Sociedade, pág. 10
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