O tão festejado e aprazível mês das férias acabou. Deu lugar a correria da volta às aulas e, como não poderia ser diferente, as universidades retomam os estudos e a academia volta ao agitado cotidiano de ensino e pesquisa. Mas nem só de estudo vive os universitários. Sempre tem um local de entretenimento onde são promovidas festas às sextas-feiras. E após uma semana de aula os acadêmicos se reúnem para se entreter. A diversão geralmente é regada à bebidas e música. Tudo com a permissão da reitoria.
Nesse ambiente festivo, o Poder Judiciário decidiu que, estando o universitário nas dependências da Universidade, a instituição é responsável, sobretudo, pela sua integridade física, além é claro da formação intelectual. O STJ confirmou sentença do juízo de 1º Grau, que condenou a Pontífice Universidade Católica de Minas Gerais a pagar indenização a uma estudante do curso de História.
O dano foi de grande proporção. A universitária foi atacada por volta das 23h por um estuprador no banheiro da Instituição de Ensino, no decorrer de uma festa organizada pelos próprios alunos. Por ter reagido ao atentado, foi esfaqueada cinco vezes pelo estuprador: uma no pescoço, uma no ombro, uma embaixo dos seios e duas nos braços.
A estudante moveu ação com pedido de indenização por danos morais contra a PUC de Minas Gerais. Provou nos autos que, no local da festa, não tinha uma iluminação adequada, tampouco seguranças para manter a normalidade ou evitar um incidente. Era tudo muito parecido com as festas do “Vadião”, no interior da Universidade Federal do Pará, que ocorrem toda sexta-feira, durante o período letivo.
O juízo de 1º grau considerou que era plenamente evitável o incidente ocorrido com a estudante e que na realização da “vinhada” deveria haver a garantia de segurança com um policiamento rígido e um eficiente sistema de iluminação. Em uma reunião de jovens em festa numa instituição de ensino é previsível que terceiros munidos de má-fé nela adentrassem e se aproveitassem do estado de torpeza ébria dos participantes intentando surrupiá-los ou obter favores sexuais. Daí o dever de indenizar da Universidade, não havendo que se falar em caso fortuito ou força maior. Portanto, condenou a Universidade ao pagamento de R$ - 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais.
Inconformada, a Universidade interpôs recurso de Apelação para o Tribunal de Minas Gerais, alegando que o lamentável ocorrido foi gerado exclusivamente por ato de terceiro, de forma manifestamente imprevisível e inevitável pela segurança mantida em toda e qualquer Universidade, o que seria uma hipótese equiparável ao caso fortuito, um fator excludente de responsabilidade.
Essa tese não prosperou.
Prevaleceu a idéia de que as circunstâncias em que ocorreram a agressão foram suficientes para descaracterizar o caso fortuito. Primeiro porque não havia no local iluminação adequada, nem seguranças no evento realizado. Daí concluir-se que o local era inseguro, sendo, portanto, previsível a ocorrência do fato, que efetivamente ocorreu. O Tribunal pesou ser lógico que numa festa realizada por jovens universitários, cujo ambiente era escuro e sem vigilância, não restaram dúvidas acerca da previsibilidade do evento danoso ocorrido com a autora. Logo, tal sinistro poderia ter sido evitado pela força humana. O que poderia ser feito com a Universidade adotando medidas de segurança, como iluminação eficaz e contratação de seguranças para inibir a tentativa de qualquer prática de ato ilícito.
Assim, foi mantida a condenação do juízo monocrático.
Inconformada, a Universidade tentando rever a decisão e o valor da condenação, e alegando infringência ao art. 535 do Código de Processo Civil, interpôs recurso para o Superior Tribunal de Justiça. Na instância superior também não logrou bom êxito a instituição de ensino superior.
Na Corte Especial não foi vislumbrado violação ao artigo sobredito. As questões decididas pelas instâncias ordinárias foram suficiente e adequadamente delineadas com abordagem integral do tema, e fundamentação totalmente compatível. Analisando o mérito, manteve o dever de indenizar da Universidade, em decorrência da responsabilidade civil que tem perante seus alunos, dentro do campus universitário. Quanto ao valor da condenação arbitrada, considerou o STJ que não foi excessivo ou irrisório. Levando-se em consideração as circunstâncias do presente caso, em que a universitária sofreu danosa tentativa de estupro e agressão, que deixaram drásticas sequelas. Logo, manteve também o valor da condenação.
Depois dessa decisão é bom os reitores ficarem com as barbas de molho, quanto às festas organizadas por alunos no interior da Universidade. E até para não causar prejuízos para a instituição, antes de liberá-las devem se certificar de que há segurança adequada e iluminação eficaz no local do evento.
Denis Farias é advogado, pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil pela Fundação Getúlio Vargas.
E-mail:denisadvogado@hotmail.com
*Esse artigo que escrevi foi publicado no Jornal O Liberal, Edição de 03/08/2010, Terça-feira, Caderno Atualidades, pag. 02
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