segunda-feira, 23 de março de 2015

Namoro Qualificado

A convivência intima entre duas pessoas, somente com expectativa de formar família no futuro, configura união estável? Os bens adquiridos durante essa convivência, que advieram do esforço de um dos conviventes, deve ser partilhado entre ambos em eventual separação?

Um homem aceitou oferta de trabalho e mudou-se para o exterior, no período em que namorava com uma mulher. Meses depois, em janeiro de 2004, tendo concluído curso superior e desejando estudar língua inglesa, a namorada o seguiu e foi morar com ele no mesmo imóvel. Ela permaneceu mais tempo do que o previsto no exterior.

Em outubro de 2004, ainda no exterior, onde permaneceram até agosto do ano seguinte ficaram noivos. Ele comprou, com dinheiro próprio, um apartamento no Brasil, para servir de residência a ambos. Em setembro de 2006, casaram-se, porém no regime de comunhão parcial de bens. Nesse regime, somente há partilha dos bens adquiridos por esforço comum e durante o matrimônio. Dois anos mais tarde, veio o divórcio.

A mulher na ação de divórcio, reivindicava a metade de um apartamento adquirido pelo então namorado, antes de se casarem. Alegou que o período entre sua ida para o exterior, em janeiro de 2004, e o casamento, em setembro de 2006, foi de união estável, e não apenas de namoro. Portanto queria além do reconhecimento daquela união, a divisão do apartamento adquirido pelo então namorado e o pagamento de aluguel, pelo uso exclusivo do imóvel desde o divórcio. O juiz de primeiro grau acatou os pedidos de união e estável e de partilha do bem, porém julgou improcedente os demais pedidos.

Com a derrota em primeira instância, o ex-marido interpôs recurso de apelação para o Tribunal do Rio de Janeiro, que decidiu que a mulher tinha direito a um terço do apartamento, em vez da metade, como queria. Ainda inconformado, o homem recorreu ao Superior Tribunal de Justiça, e ao caso ficou sob a relatoria do ministro Marco Aurélio Bellizze.

Para que um relacionamento amoroso se caracterize como união estável, basta somente ser duradouro e público, ainda que o casal venha, circunstancialmente, a habitar a mesma residência? O paradigma que se tinha até então era que sim! Era fruto daquela ideia de que “pegou na mão, pagou pensão”.

Ao contrário do Tribunal Estadual, o STJ concluiu que não houve união estável, mas sim namoro qualificado! Pois, considerando o estreitamento do relacionamento, houve uma projeção para o futuro do casal e não para o presente. Na época do namoro não havia o propósito de constituir entidade familiar. Na visão do STJ, a formação do núcleo familiar, em que há o compartilhamento de vidas, com irrestrito apoio moral e material, enfim os requisitos de uma vida conjunta, tem de ser concretizada, e não somente planejada, para que se configure a união estável.

Ademais, a coabitação por si só não evidencia a constituição de união estável, que homem e mulher por contingências e interesses particulares podem constituir. No caso em análise, por exemplo, ele a trabalho e ela, por estudo, foram, em momentos distintos, para o exterior e, como namorados que eram, passaram a residir conjuntamente.

Se há o entendimento de viver em união estável, no período anterior ao casamento, há que se escolher outro regime de casamento, que abarque o único imóvel de que o casal dispunha, ou mesmo converter em casamento a alegada união estável. Sem isso, não há evidencias suficientes de desejo subjetivo de constituir família.

Seguindo esse novo paradigma, o Superior Tribunal de Justiça acolheu o recurso do homem, em que sustentava ter sido apenas namoro e não união estável, o período de mais de dois anos de relacionamento, que antecedeu o casamento entre ele e a ex-mulher.
Portanto, o novo entendimento delineado pelo STJ, determina que para ser reconhecida a união estável e partilha de bens é fundamental que haja um elemento subjetivo: a vontade ou o compromisso pessoal e mútuo de constituir família!

Denis Farias é advogado
E-mail: denisadvogado@hotmail.com
Artigo publicado no Jornal "O Liberal", Caderno Atualidades, pág. 02.

2 comentários:

Diego Cavalcante disse...

Tava querendo ler esse artigo na íntegra e ficou excelente, parabéns amigo !

Unknown disse...

Muito interessante essa situação, adorei a matéria!
Parabéns amigo Denis.