quarta-feira, 28 de maio de 2014

Sentença de Morte

Em nosso país, a liberdade de crença consta na lista dos direitos fundamentais, proclamado pela Constituição República do Brasil. A Carta de 1988 garante também a liberdade de culto religioso. Contudo, existem países em que a legislação e o judiciário adotam a condenável postura de intolerância religiosa?

Um tribunal de Cartum, capital do Sudão, condenou, na última quinta-feira, uma mulher de 27 anos de idade chamada Ibrahim por apostasia, ou seja, renúncia da fé, e a pena foi a morte. O pai dela era mulçumano e a mãe, ortodoxa etíope. O pai morreu quando ela tinha apenas 6 anos, e ela foi criada por sua mãe, que era cristã e lhe ensinou a fé que tinha em Jesus Cristo.

Porém, um irmão de Ibrahim formulou uma denuncia, alegando que ela havia desaparecido há vários anos, e que sua família se surpreendeu ao descobrir, que ela havia casado com um homem cristão. Devido ao patriarca da família ser mulçumano, o tribunal aplicando a lei islâmica, negou o reconhecimento do matrimonio e a condenou por ter cometido adultério, com uma pena de 100 chicotadas antes da forca!

Antes de proferir a sentencia, o tribunal deu uma oportunidade dela se retratar de sua fé cristã. Mas Ibrahim sustentou perante a Corte: “Sou Cristã, e vou continuar sendo cristã!” Por questões processuais, a sentença ainda não será executada à curto prazo. A Constituição do Sudão atenua a lei islâmica em caso de sentença, que condena mulheres grávidas, o que é o caso Ibrahim, que está gestante de oito meses e tem um filho de vinte meses. Logo, a sentença aguardará para ser cumprida em até dois anos após o nascimento do bebê.

O advogado de Ibrahim sustenta que vai lutar para reformar a sentença nas instâncias superiores e irá recorrer inicialmente para um tribunal de apelação. Depois para a Corte Suprema do Sudão e até a última instância, que é o Tribunal Constitucional. Contudo, deixou bem claro que protestos internacionais poderão pressionar o governo do Sudão a solucionar a questão.

Interpretações da Constituição do Sudão permitem a conversão religiosa. Portanto, é possível que o Tribunal de Apelação reforme a sentença de morte prolatada pelo tribunal de primeira instância. Movimentos sociais no próprio Sudão defendem a inconstitucionalidade da sentença e repudiam essa decisão judicial por violar o direito regional e internacional.

O país adota a lei islâmica aos mulçumanos e aos não mulçumanos. Julga e aplica penas para casos classificados como "indecência" e "imoralidade". As condenações vão de chicotadas a amputações. Mas o desvio da fé islâmica é considerado um delito punível com a morte. Agentes do governo Sudão intimidam e às vezes torturam pessoas, quando suspeitas de terem se convertido ao cristianismo. Por isso, desde 1999, o Sudão é considerado um dos piores infratores dos direitos religiosos do mundo.

Grupos de direitos humanos e governos ocidentais representados pelos Estados Unidos, Grã-Bretanha, Canadá e Países Baixos já começaram a criticar expressamente a malfadada sentença. Está sendo articulada uma pressão para o governo do Sudão, respeitar o direito de liberdade de religião, incluindo o direito a mudar de fé ou crenças. Aliás, esse direito está consagrado no direito internacional dos direitos humanos. A anistia Internacional já declarou Ibrahim como uma presa de consciência.

É um absurdo classificar o adultério e a apostasia como delitos, e pior ainda de natureza grave e punível com a morte. Tal fato representa uma violação ao direito internacional dos direitos humanos.

Não podemos aceitar que uma mulher seja condenada a morte por sua opção religiosa, e chicoteada por casar-se com um homem supostamente de outra religião! Isso é abominável. A situação é apocalíptica! Mas nós não podemos nos calar diante de tamanha afronta e violação aos direitos humanos religiosos! É inadmissível aceitar perseguições de pessoas em decorrência da sua fé!

Denis Farias é advogado
E-mail: denisadvogado@hotmail.com
Artigo publicado no Jornal "O Liberal", Caderno Atualidades, pág. 02. Sábado 24.

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