sábado, 5 de abril de 2014

Confisco de Renda

No último final de semana concluímos a ministração do módulo de 'Sistema Recursal' no MBA em Direito Processual promovido pela faculdade Maurício de Nassau, liderado pela sábia professora Eva Franco em Santarém, a Pérola do Tapajós. Muito proveitoso, sobretudo, devido a participação interativa dos discentes, que peço vênia para homenagear a todos, na pessoa da nobre colega Ana Cláudia Waughan. Dentre muitos assuntos,discutimos sobre o cabimento da ação direita de inconstitucionalidade no sistema processual vigente.

Na oportunidade citei como exemplo o caso do Conselho Federal da OAB, que cumprindo seu papel legal e constitucionalmoveu uma Ação Direta de Inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal, pedindo a correção da tabela do Imposto de Renda. Desde 1996, a base de cálculo está defasada em 61,2%. O número baseia-se em estudo do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos.

Atualmente, estão isentos do imposto quem ganha até R$ 1.787. Caso a tabela fosse corrigida, a isenção iria até R$ 2.758. A correção beneficiaria 20 milhões de pessoas. Desse total, 8 milhões deixariam de pagar o imposto e passariam a ser isentos.

A OAB pedia liminar para que a correção fosse válida já neste ano. E para evitar uma queda brusca na arrecadação, propunha que a tabela fosse corrigida de forma escalonada pelos próximos dez anos. Dessa maneira, em 2015 haveria a correção pela inflação anual, mais 6% da defasagem, e assim até 2025. A ação foi distribuída ao ministro Luis Barroso, que deixou de apreciar a liminar, sob a alegação de se tratar de situação já vigente de longa data, e de que qualquer provimento para valer neste ano interferiria, de modo drástico, com estimativa de receita já realizada, e, consequentemente, com princípios orçamentários.

Vale lembrar, que o STF demonstrou entendimento semelhante, quando declarou inconstitucional a Emenda n.º 62, por corrigir os precatórios pela Taxa Referencial, índice que tem ficado abaixo da inflação. No vertente caso busca-se aplicar o mesmo raciocínio que o STF já usou na ADI dos precatórios, poisa correção de direito abaixo da inflação caracteriza confisco. Ademais, a própria leidispõe expressamente, que a tabela será corrigida pela inflação. Contudo,deve ser pela inflação efetiva, não pela projetada, evitando assim uma correção maquiada.

Segundo a melhor doutrina o 'confisco tributário' ocorre quando o Estado toma de um indivíduo ou de uma classe, além do que lhes dá em troca, caracterizando, portanto, o desvirtuamento do imposto em confisco. Além disso, a Constituição estabelece no artigo 150, inciso IV, o Princípio do Não-Confisco Tributário, determinado que 'sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: IV – Utilizar tributo com efeito de confisco'.

Você conhece alguém que recebe serviço público de qualidade em troca dos impostos que são pagos?

Em 1996 a isenção se estendia para quem ganhava até 8 salários mínimos, hoje não alcança nem 3. Um cidadão que ganha R$ 2,7 mil não teria de pagar IR, mas hoje ele já começa pagando 15%. Um verdadeiro confisco da renda do trabalhador, pois o governo está tributando a base da pirâmide.

Corrigir a tabela de acordo com a expectativa de inflação do governo é um conto de fadas. Necessário, portanto, a interpretação conforme à Constituição, dos dispositivos legais que reconhecem que a inflação é o correto indexador da tabela do IR. Porém, a inflação efetivamente verificada ao fim de cada exercício, e não a meta governamental. A meta é só uma previsão. Se a previsão não for confirmada, como aconteceu nos últimos 16 anos, ela deve ser substituída pelo dado do mundo real, a inflação efetiva. Doutro modo, governo seguirá praticando a tributação do mínimo existencial, violando preceitos constitucionais de proteção ao contribuinte, sobretudo o do não-confisco.

Denis Farias é advogado
E-mail:denisadvogado@hotmail.com

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