Situação corriqueira no Judiciário são ações envolvendo concurseiros e banca examinadora de concursos.
Um candidato identificou uma suposta ilegalidade no concurso público de seleção para o cargo de Oficial Escrevente, realizado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. O conteúdo cobrado em duas questões, não estava previsto no edital do certame. Vendo-se prejudicado impetrou ação de mandado de segurança, pleiteando o reconhecimento da ilegalidade indicada, por conseguinte a anulação judicial das referidas questões.
A segurança fora denegada pelo juízo de origem, sob a alegação de que a matéria estava sim contida no Edital, e ainda que não estivesse os candidatos poderiam ter respondido as questões, pelo método de eliminação. E que não haveria possibilidade de o Poder Judiciário, rever o mérito administrativo ou mesmo substituir a banca examinadora, na avaliação dos critérios de correção de provas.
Inconformado, o candidato interpôs recurso RMS n.º 36596, para o Superior Tribunal de Justiça. Na Corte Especial fora ratificado que a Jurisprudência sedimentou-se no entendimento de que, a intervenção jurisdicional é necessária nas hipóteses de flagrante ilegalidade do certame. Até porque nesses casos é inequívoco que o Edital constituiu lei entre o candidato e a respectiva banca examinadora.
É bem verdade que o Judiciário está restrito ao exame da legalidade do certame. Portanto, cumpre verificar se a prova elaborada mantém relação de conformidade com as regras estabelecidas no Edital. E isso não implica em examinar a procedência ou não, da tese dos candidatos, de resolverem as questões pelo método de eliminação das assertivas erradas.
Na verdade, a banca examinadora defendia a legalidade das questões impugnadas, partindo do pressuposto de que as questões impugnadas poderiam ser solucionadas pelo método de eliminação.
Tal como ocorre com a motivação do ato administrativo, que tem a ver com a teoria dos motivos determinantes, da mesma forma o conteúdo editalício gera vinculação não apenas para os candidatos, mas também para a administração pública.
Portanto, analisando o caderno de provas e as regras contidas no Edital, o Tribunal Superior considerou que o enunciado das questões consideradas corretas pelo gabarito, exigia que o candidato tivesse conhecimentos sobre tipos penais e o conteúdo programático do edital não contemplava a infração penal descrita no Código Penal, tampouco contemplava no Edital a matéria processual penal.
Observar tal ilegalidade, não viola o princípio da separação harmônica dos poderes, descrito nos artigos 2º e 60, parágrafo 4º, III, da Constituição Federal. O critério de correção de provas é de competência da banca examinadora. Entretanto a intervenção do Poder Judiciário incide para discutir a legalidade da questão.
Nos autos ficou constatada violação ao princípio da proteção da confiança, que aliado a boa-fé objetiva e a segurança jurídica, garante a tutela das expectativas, formadas pela presunção de legitimidade, que reveste os atos administrativos emitidos pelo poder público. A formulação de questões de prova de concurso devem contemplar o conteúdo programático previsto no edital. O que, na espécie, não ocorreu em relação às questões discutidas.
Não é possível garantir que os candidatos teriam conhecimento de matérias que não constam no edital, por se tratar de seleção de nível médio ou equivalente, o que fere o princípio da impessoalidade, visto que a prova privilegiava os candidatos com formação superior.
Seguindo o voto do relator, o Tribunal deu provimento ao recurso do candidato para anular as questões do concurso público que estavam incompatíveis com o Edital, para provimento do cargo de oficial escrevente por manifesta ilegalidade na formulação de enunciados, que veicularam conteúdo não previsto no programa editalício.
Portanto, fica a dica para os elaboradores de prova ler o Edital, antes de pensarem nas questões!
Denis Farias é advogado
Email: denisadvogado@hotmail.com
Artigo publicado também no Jornal O Liberal, Caderno Atualidades, pág. 02, terça-feira, 01 de outubro de 2013.
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