A reforma agrária, se colocada em prática com probidade, honestidade e movido pelo ideal de justiça social, pode ser a solução para estreitar o abismo existente entre ricos e pobres de um país continental como o Brasil. Em épocas de eleição, o verdadeiro patrão da nossa democracia, o povo, deve cobrar dos presidenciáveis uma política de reforma agrária séria.
Discutindo os critérios para desapropriar um imóvel rural por interesse social, para fins de reforma agrária, o Superior Tribunal de Justiça foi chamado para aplicar o melhor direito ao caso concreto.
Para o TJ de Goiás, a desapropriação por interesse social, para fins de reforma agrária, deve observar os critérios de classificação da propriedade em pequena, média ou grande. E nesse enquadramento devem ser excluídas as áreas não aproveitáveis. Lembrando que não podem ser desapropriadas ainda que para fins de reforma agrária a pequena e a média propriedade rural, nos termos do art. 185 da Constituição Federal e parágrafo único do art. 4º da Lei 8.629/93. Esse Tribunal sabiamente delineou que, para classificar a propriedade rural em pequena, média ou grande, o número de módulos fiscais deverá ser obtido dividindo-se a área aproveitável do imóvel pelo módulo fiscal do respectivo Município onde a propriedade está situada.
Diante desse quadro, o Instituto de Colonização e Reforma Agrária, com um entendimento divergente, teve que interpor Recurso Especial, na forma do art. 105, III, alínea “a” da Constituição Federal para o Colendo STJ. Nos fundamentos do recurso, discutiu sobre a correta metodologia a ser considerada para classificar uma propriedade rural em pequena, média ou grande, conforme a disciplina legal e constitucional. Alegou que o TJ de Goiás contrariou as disposições contidas no art. 4º da Lei 8.629/93, ao aplicar a forma estabelecida no Decreto n.º 84.685/80, para classificar.
O julgamento-mor, ficou a cargo do Ministro-Relator Humberto Martins, nos autos do REsp n.º 1.161.624-GO. Em seu voto, o ministro de pronto, identificou que o cerne da questão em debate era determinar se a área não aproveitável de um imóvel rural, integra ou não, o cálculo em que se define, se o imóvel para fins de desapropriação por interesse social para reforma agrária é pequeno, médio ou grande.
O ponto de partida é ter em mente que um dos princípios basilares do Direito Agrário apresenta-se desenhado na ideia de que o imóvel rural não deve decair do mínimo razoável para o sustento de uma família. Inclusive, o artigo 185 da CF proíbe terminantemente a expropriação da pequena e da média propriedade nos casos em que o proprietário não possui outra. Por outro lado, o Estatuto da Terra, Lei n.º 4504/64, estabelece que o mínimo familiar, indivisível de porção de terra, está ligado ao conceito de Módulo Rural. A melhor doutrina conceitua Módulo Rural como a unidade de medida que corresponde ao mínimo necessário e suficiente para uma família desenvolver sua força de trabalho, garantir seu sustento e buscar o progresso social e econômico. Nesse sentido, a filosofia traçada pelo Estatuto da Terra, qualifica Módulo Rural como uma medida de área ideal, que dimensionasse economicamente o imóvel rural, possibilitando as condições sociais e econômicas para uma família média rural explorar e subsistir com dignidade.
Nesse contexto, a Lei 6.746/79, criou um novo conceito: o Módulo Fiscal. De início era somente um critério técnico para classificar a área da propriedade rural e calcular o Imposto Territorial Rural. Posteriormente, a Lei n.º 8629/93, no art. 4º, incisos I, conceituou o imóvel rural como o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativista vegetal, florestal ou agro-industrial. No inciso II e III, classifica a pequena e média propriedade usando como critério só o Módulo Fiscal, que é de cunho meramente arrecadatório ou fazendário, e trata mais de Direito Tributário do que Direito Agrário. Deixou de lado o componente familiar, que socialmente é mais significativo e juridicamente mais sustentável. Entretanto, o art. 50, parágrafo 3º do Estatuto da Terra, dispõe que o número de módulos fiscais de um imóvel rural será obtido dividindo-se sua área aproveitável pelo modulo fiscal do Município.
Assim, o STJ julgou improvido o recurso, confirmou a decisão recorrida, entendendo que o correto é integrar as normas, interpretando sistematicamente, dentro da lógica do Estatuto da Terra e do Direito Agrário. Logo, a desapropriação para fins de reforma agrária, deve levar em consideração somente a área aproveitável e não a área total do imóvel. E o número de módulos fiscais será obtido dividindo-se a área aproveitável do imóvel rural pelo módulo fiscal do Município.
Denis Farias é advogado, pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil pela Fundação Getúlio Vargas.
E-mail: denisadvogado@hotmail.com
*Esse artigo que escrevi foi publicado no Jornal O Liberal, no Caderno Atualidades, pag. 02, Edição de Terça-feira, 27/07/2010.
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