segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Esqueça-me

A decisão da Comissão Nacional de Informática e das Liberdades francesa, em junho deste ano, de estender a sites de buscas do mundo todo a decisão da Corte de Justiça Europeia que garantiu o direito ao esquecimento, ou o “direito de deslistar”, reacendeu o debate sobre o direito de ser esquecido, sobretudo no mundo virtual.

O órgão regulador francês ordenou para o Google não listar em suas versões de buscas europeias e mundiais, links classificados como “inadequado”, “irrelevante ou não mais relevante”, “excessivo” ou que não tinha interesse público.

O direito ao esquecimento já é legal na Europa. No Brasil, tramita na Câmara Federal o Projeto de Lei n.º 1676/2015, que impõe remoção de conteúdo online sem ordem judicial, bastando alegar direito ao esquecimento. Os titulares do direito ao esquecimento poderão exigir dos meios de comunicação, dos provedores de conteúdo e dos sítios de busca da rede mundial de computadores, internet, independentemente de ordem judicial, que deixem de veicular ou excluam material ou referências que os vinculem a fatos ilícitos ou comprometedores de sua honra.

Essa teoria surgiu a partir da ideia de que, mesmo quem comete um crime, depois de determinado tempo, vê apagadas todas as consequências penais do seu ato. No Brasil, dois anos após o cumprimento da pena, ou da extinção da punibilidade por qualquer motivo, o autor do delito tem direito à reabilitação.

Depois de cinco anos, afasta-se a possibilidade de considerar-se o fato para fins de reincidência, apagando-o de todos os registros criminais e processuais públicos. Essa é a origem da teoria do direito ao esquecimento, consagradora do right to be let alone, ou seja, do direito a permanecer sozinho, esquecido, deixado em paz.

A tese de que ninguém é obrigado a conviver para sempre com erros do passado, foi assegurada pelo STJ no julgamento dos recursos especiais n.º 1.334.097 e 1.335.153.

O direito ao esquecimento entrou em pauta com mais contundência desde a edição do Enunciado 531 da VI Jornada de Direito Civil, promovida pelo Conselho da Justiça Federal. O texto elenca o direito de ser esquecido entre os direitos da personalidade. O Enunciado estabelece que, o direito de não ser lembrado eternamente pelo equívoco pretérito, ou por situações constrangedoras ou vexatórias é uma forma de proteger a dignidade humana.
O surgimento como um direito personalíssimo a ser protegido, teve origem na esfera criminal. Mas atualmente foi estendido a outras áreas, como, por exemplo, nas novas tecnologias de informação. Ele tem sido abordado na defesa dos cidadãos, diante de invasões de privacidade pelas mídias sociais, blogs, provedores de conteúdo ou buscadores de informações.

O instituto ganha contornos mais fortes em razão da facilidade de circulação e de manutenção de informação pela internet, capaz de proporcionar superexposição de boatos, fatos e notícias a qualquer momento. Mesmo que decorrido muito tempo desde os atos que lhes deram origem.

Na sociedade de informação atual, até mesmo os atos mais simples e cotidianos da vida pessoal podem ser divulgados em escala global, em velocidade impressionante. Vale lembrar que o direito ao esquecimento não se sobrepõe ao direito à liberdade de informação e de manifestação de pensamento.

É necessário que haja uma grave ofensa à dignidade da pessoa humana, que a pessoa seja exposta de maneira ofensiva. Os danos causados por informações falsas, ou mesmo verdadeiras, da esfera da vida privada e da intimidade, veiculadas através da internet, são potencialmente muito mais nefastos do que na época em que a propagação da notícia se dava pelos meios tradicionais de divulgação.

É uma garantia contra o que a doutrina tem chamado de superinformacionismo. Ainda há muito espaço para o amadurecimento do assunto, de modo a serem fixados os parâmetros para que seja acolhido o esquecimento de determinado fato, com a decretação judicial da sua eliminação das mídias eletrônicas.

Denis Farias é advogado
E-mail: denisadvogado@hotmail.com

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