sábado, 23 de abril de 2011

Uniões Estáveis Paralelas

Ocorrem muitos encontros amorosos movidos a paixões repentinas. Poucos se tornam prolongados. Raramente evoluem para um casamento, porém alguns se transformam naquilo que a sociedade moderna convencionou chamar de união estável.

Temos várias formas de entidade familiar. O artigo 226 da Constituição Federal trata a família como a base da sociedade, e lhe empresta uma proteção especial. Para facilitar o matrimônio, garante que o casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. Contudo, para efeito da proteção do Estado, a Carta Magna ainda reconhece a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, e assevera que a lei deve facilitar a sua conversão em casamento.

Ainda na filosofia de proteção estatal, a lei deixa claro que é também entidade familiar, a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, ou seja, a mãe ou o pai solteiro e seu filho ou filha. O dispositivo legal assegura inclusive, que os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal, podem ser exercidos em ampla igualdade pelo homem ou pela mulher. Acabou o pátrio poder, temos hoje um poder familiar, isto é, o homem e a mulher têm poder de mando na condução dos assuntos da família!

Portanto, conclui-se que o rol enumerado pelo art. 226 da Constituição é meramente exemplificativo, quanto às diversas formas de entidade familiar. Visualizamos assim, uma pluralidade qualitativa, e não quantitativa. Além disso, como não é dado à Carta Magna tecer detalhes, fica com o legislador ordinário o encargo de disciplinar o conceito de cada entidade familiar.

No que diz respeito à união estável, encontramos no Código Civil de 2002, seus parâmetros básicos. O art. 1.723, desta lei, esclarece que a entidade familiar na forma de união estável entre o homem e a mulher é aquela em que há uma convivência pública, contínua e duradoura, estabelecida com o objetivo de constituição de família. Cabe ressaltar, que mesmo a pessoa devidamente casada, pode contrair uma união estável com outra. Entretanto, isso ocorre somente nos casos em que estiver separada de fato ou separada judicialmente!

Portanto, percebe-se que nem mesmo o casamento é um óbice para a constituição de uma união estável. No entanto, o fator de exclusividade de relacionamento sólido, duradouro e com o objetivo de constituir família é a condição de existência jurídica da união estável.

Aparentemente o ordenamento jurídico está a incentivar a proliferação de várias uniões, tal como nos países onde a poligamia é permitida, e o homem pode ter várias mulheres ao mesmo tempo como suas esposas, companheiras e/ou concubinas. Porém, se assim ocorresse, caminharíamos para um estado de promiscuidade sem precedentes!

O Superior Tribunal de Justiça em recente decisão, contida nos autos do Recurso Especial nº 912.926-RS, sob a Relatoria do Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 22/2/2011, felizmente entendeu que o impedimento para a o reconhecimento da união estável não é a existência de um matrimônio, mas sim a concomitância, a existência, ao mesmo tempo, de outra relação afetiva fática, duradoura, ou seja, de outra convivência de fato, de outra união estável.

Portanto, por uma interpretação lógica do ordenamento jurídico, conclui-se que não pode haver duas uniões estáveis ao mesmo tempo! Repita-se: havendo uma separação de fato, nem mesmo o casamento impede a caracterização da união estável, daí ser inviável a declaração de duas uniões estáveis ao mesmo tempo, ser impossível um paralelismo de união estável. O pedido de declaração de duas uniões estáveis ao mesmo tempo é juridicamente impossível! Segundo acertado entendimento do próprio STJ.

Denis Farias é advogado, pós-graduando em Direito Civil e Processo Civil pela Fundação Getúlio Vargas.
E-mail: denisadvogado@hotmail.com

2 comentários:

Anônimo disse...

muito interessante e esclarecedor! você sempre surpreende! parabéns doutor!!!

Unknown disse...

Caro Amigo Denis.
Peço vênia para esclarecer alguns aspectos de seu judicioso artigo.
Há suposta contradição entro o disposto nos arts. 1723 e 1727 do NCC.
O 1º determina ser entidade familiar a união pública, contínua e duradoura entre homem e mulher, excepecionalizando em seus §§ a não aplicação do inciso VI do art. 1521 (impedimento absoluto) nem as causas suspensivas do casamento do art. 1523.
Contudo, o art. 1727 prevê expressamente que as uniões não eventuais entre o homem e a mulher impedidos de casar, constitui concubinato.
Duas Leis vigoram regulamentando os direitos dos companheiros: a 8971/94 que regula o direito dos companheiros a alimentos e à sucessão e a 9278/96 que regulamenta o §3º do art. 226, da Lex Mater.
É de se ressaltar que nenhumas das leis referidas assegura direito aos concubinos, ficando as relações advindas dessas relações afetas ao direito obrigacional e não de família.
A discussão começa a esvanecer da leitura do texto do art. 1º da Lei 8971, que assegura à companheira comprovada de um homem solteiro, separado judicialmente (estado civil extinto pela EC/66 de 14/7/10), divorciado ou viúvo, que com ele viva há mais de cinco anos, ou dele tenha prole, poderá valer-se do disposto na Lei nº 5.478/68, enquanto não constituir nova união e desde que prove a necessidade. Novamente não se fala em concubinos !
A doutrina atual é unânime acerca do tema, firmando entendimento que se ambos os companheiros têm conhecimento de que pelo menos um deles comente adultério (por ainda estar casado com outrem) ou vive outra união concubinária concomitante, não receberá qualquer direito na seara familiar.
Assim, a jurisprudência vem afastando a denominação de união estável quando houver outra união ou casamento paralelo e o faz em nome da monogamia; por isso doutrina e jurisprudência afastam a possibilidade de estas uniões paralelas receberem direitos em sede de direito de família e sucessório.
Facilmente se vê que o Direito não protege o concubinato adulterino. A amante, amásia, ou qualquer nomeação que se dê à pessoa que, paralelamente ao vínculo de casamento, mantém uma outra relação, uma segunda ou terceira... ela será sempre a outra, ou o outro, que não tem lugar em uma sociedade monogâmica. Alguns autores preferem nomear essas relações como "concubinato impuro", em oposição a "concubinato puro", ou "honesto" ou aqueles em que não há impedimento legal para o estabelecimento da relação. É impossível ao Direito proteger as duas situações concomitantemente, sob pena de contradizer todo o ordenamento jurídico."
Czajkowski leciona não se poder considerar o concubinato adulterino como entidade familiar, afirmando que "é inviável no sentido de ser juridicamente inaceitável” (União Livre à luz das leis 8.971/94 e 9.278/96. Curitiba: Juruá, 1996, p. 49-50).
Há precedentes no STF desde a década de 70 (Rec. Ext. nº 81.707-RJ, j. 12/09/75. In RTJ n. 75, p. 965/68) e o STJ tem mantido esse entendimento (EDcl no Ag. 830.525/RS, j. em 18/09/2008, DJ 06/10/2008)
A exegese dos dispositivos legais referidos, bem como dos arestos acima mencionados, nos remetem à conclusão de que não há como ser conferido status de união estável à relação concubinária concomitante a casamento válido nem à outra união livre.
Subsume-se, portanto, que o casamento é óbice para o reconhecimento de união estável, relegando-se ao tipo concubinato toda e qualquer relação paralela a casamento válido e união estável reconhecida.
Espero ter colaborado para o engrandecimento de seu judicioso blog.
Abraços fraternos do amigo, sempre.

Cláudio Roberto Vasconcelos Affonso
Professor de Direito de Família e Sucessões
Pós graduado em Direito Civil Latu Sensu